segunda-feira, 23 de junho de 2014

O caminhar da esperança


Por Marcela Ervolino

No debate utopia “versus” distopia não há melhor ou pior. Há uma conveniência relativa, isto é, de acordo com a situação, dá-se preferência a uma ou a outra. Visões extremistas só alimentam essa discussão infinita, a qual não possibilita a exclusão de ideias, mas ,sim, a fusão delas.

Etimologicamente, utopia significa “em nenhum lugar”. Após ser usada para intitular o livro de Thomas Morus, adotou o sentido de sociedade perfeita. Nesse livro, Morus ironiza a Inglaterra, no contexto dos cercamentos, propondo a existência de uma sociedade igualitária, desprendida de bens materiais, que respeita as leis e a moral, considerando como medida principal o fim da propriedade privada. Assim como Morus, atualmente há idealistas que creem um futuro melhor: veem na superabundância tecnológica e informacional o início de uma revolução no acesso a água, alimentos, energia, educação e saúde. No entanto, a concretização do futuro positivo, tanto de Morus quanto dos utópicos atuais, depende de fatores que se distanciam da realidade exequível. Em suma, a essência da utopia consiste na sobreposição do ideal ao real, como algo que não é, mas pode vir a ser.

Por outro lado, a distopia se revela como uma interpretação pessimista do presente e do futuro, considerando impossível a passagem para um mundo melhor. Na obra “Admirável Mundo Novo”, Aldous Huxley previu uma sociedade estamental, com base no modelo fordista, em que o progresso científico e o desenvolvimento tecnológico seriam os promotores da barbárie. Sob o mesmo ponto de vista, Isaac Asimov, em sua obra “Eu, robô”, projetou uma sociedade que, diante do aprimoramento das tecnologias, amedronta-se com a possibilidade das máquinas tomarem o poder. Tais visões, bem como a dos distópicos modernos, não passam da expressão do descontentamento com o presente em que se vive.

A realidade humana precisa ser encarada levando-se em conta toda sua relatividade. Logo, a melhor vertente é a dos que são realistas sem perderem a esperança. Utopia e distopia estão entrelaçadas. Toda utopia carrega consigo o pessimismo de experiências cotidianas insatisfatórias que motivam a fuga para o “lugar nenhum” onde a felicidade possa ser plena. Analogamente, as distopias se tornam remotas ao passo que consideram impossíveis melhorias, ainda que isoladas, na sociedade.

O presente é, sem dúvidas, deprimente: guerra, fome, miséria, egoísmo. Todavia, isso não significa que o futuro também o deva ser. O trabalho de algumas ONG’s, campanhas humanitárias, e até as recentes manifestações em todo Brasil, mostram que muitos veem a realidade distópica e não se acomodam. Lutam por suas utopias racionalmente fundadas; lutam porque acreditam que há, em cada ser humano, uma bondade e uma ética adormecidas; lutam para que amanhã outros não tenham que lutar; lutam por aqueles que não podem lutar. Em palavras de Eduardo Galeano: “A utopia está lá no horizonte. Aproximo-me dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar.”

* Marcela Ervolino, aluna do Cursinho, turma 2013. Aprovada em medicina.

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segunda-feira, 23 de junho de 2014

O caminhar da esperança


Por Marcela Ervolino

No debate utopia “versus” distopia não há melhor ou pior. Há uma conveniência relativa, isto é, de acordo com a situação, dá-se preferência a uma ou a outra. Visões extremistas só alimentam essa discussão infinita, a qual não possibilita a exclusão de ideias, mas ,sim, a fusão delas.

Etimologicamente, utopia significa “em nenhum lugar”. Após ser usada para intitular o livro de Thomas Morus, adotou o sentido de sociedade perfeita. Nesse livro, Morus ironiza a Inglaterra, no contexto dos cercamentos, propondo a existência de uma sociedade igualitária, desprendida de bens materiais, que respeita as leis e a moral, considerando como medida principal o fim da propriedade privada. Assim como Morus, atualmente há idealistas que creem um futuro melhor: veem na superabundância tecnológica e informacional o início de uma revolução no acesso a água, alimentos, energia, educação e saúde. No entanto, a concretização do futuro positivo, tanto de Morus quanto dos utópicos atuais, depende de fatores que se distanciam da realidade exequível. Em suma, a essência da utopia consiste na sobreposição do ideal ao real, como algo que não é, mas pode vir a ser.

Por outro lado, a distopia se revela como uma interpretação pessimista do presente e do futuro, considerando impossível a passagem para um mundo melhor. Na obra “Admirável Mundo Novo”, Aldous Huxley previu uma sociedade estamental, com base no modelo fordista, em que o progresso científico e o desenvolvimento tecnológico seriam os promotores da barbárie. Sob o mesmo ponto de vista, Isaac Asimov, em sua obra “Eu, robô”, projetou uma sociedade que, diante do aprimoramento das tecnologias, amedronta-se com a possibilidade das máquinas tomarem o poder. Tais visões, bem como a dos distópicos modernos, não passam da expressão do descontentamento com o presente em que se vive.

A realidade humana precisa ser encarada levando-se em conta toda sua relatividade. Logo, a melhor vertente é a dos que são realistas sem perderem a esperança. Utopia e distopia estão entrelaçadas. Toda utopia carrega consigo o pessimismo de experiências cotidianas insatisfatórias que motivam a fuga para o “lugar nenhum” onde a felicidade possa ser plena. Analogamente, as distopias se tornam remotas ao passo que consideram impossíveis melhorias, ainda que isoladas, na sociedade.

O presente é, sem dúvidas, deprimente: guerra, fome, miséria, egoísmo. Todavia, isso não significa que o futuro também o deva ser. O trabalho de algumas ONG’s, campanhas humanitárias, e até as recentes manifestações em todo Brasil, mostram que muitos veem a realidade distópica e não se acomodam. Lutam por suas utopias racionalmente fundadas; lutam porque acreditam que há, em cada ser humano, uma bondade e uma ética adormecidas; lutam para que amanhã outros não tenham que lutar; lutam por aqueles que não podem lutar. Em palavras de Eduardo Galeano: “A utopia está lá no horizonte. Aproximo-me dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar.”

* Marcela Ervolino, aluna do Cursinho, turma 2013. Aprovada em medicina.

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